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As diferenças doutrinárias com Roma são somente semânticas?

Atualizado: 18 de out. de 2021

Como que uma simples diferença semântica pode separar oriente e ocidente por mais de mil anos? Como questões doutrinárias como a da "infalibilidade" poderiam ser somente semânticas?


É o que, mais uma vez, certo apologista latino afirma: "... uma parte considerável dos teólogos ortodoxos entende que quase todas as divergências são meramente semânticas."

Em outra ocasião, diz que estão neste âmbito semântico a cláusula filioque, a Imaculada Conceição, distinção entre Essências e Energias; pois "as discussões estavam avançadas e tudo poderia ser harmonizado". Para isso, ele usa de exemplo um conhecido bispo ortodoxo que deu uma opinião acerca do filioque. Só que isso nada mais é do que theologoúmenon, em grego θεολογούμενον, uma opinião pessoal e não doutrinária de algum teólogo. E ainda que um bispo ou teólogo, em particular, exponha ou defenda de alguma forma essa posição, ele não fala em nome da Igreja. Aliás, as opiniões teológicas e acadêmicas são somente o último âmbito de estudo acerca das afirmações da Igreja.


Infelizmente, há pessoas na Igreja, deslumbradas com uma teologia academicista, adeptos do liberalismo teológico e militantes de mudanças nefastas na Igreja para acomodar a Ortodoxia ao zeitgeist, o espírito da época — serem "relevantes" para o mundo moderno, e assim, como observamos claramente no ocidente, a transformação do cristianismo em uma mera filosofia de bem-estar, ou de política afirmativa e identitária; em política social ou ideologia, militância e defesa de bandeiras — como se o Corpo de Cristo fosse só mais uma instituição humana que necessitasse de adequação ao tempo, de "desenvolvimento" e de abraçar a modernidade. A defesa do ecumenismo, a pan-heresia, se encontra entre esses.


Em relação ao bispo ortodoxo, citado acima, há inúmeros outros teólogos e bispos que confrontam essa visão, reafirmando a posição de São Fócio, São Marcos de Éfeso, São Gregório Palamas; e também de papas romanos como João VIII e Leão III, por exemplo.

Especificamente, acerca de Leão III, lemos a sua atitude ortodoxa, contrária ao filioque na Encíclica Patriarcal de 1895, em resposta a uma Encíclica latina de Leão XIII:


"Assim, a Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica dos sete Concílios Ecumênicos, confessa e ensina, fiel ao Evangelho, que o Espírito Santo procede do Pai. Mas no Ocidente, a partir do século IX, o santo credo composto e aprovado pelos Concílios Ecumênicos foi falsificado e a idéia de que o Espírito Santo procedia também do Filho (Filioque) foi arbitrariamente difundida. E certamente, o Papa Leão XIII sabe que seu predecessor e homônimo, o Papa ortodoxo Leão III, confessor da ortodoxia, condenou sinodicamente, no ano 809, a adição do Filioque como sendo contrária ao Evangelho e totalmente ilegítima, e que em seguida mandou gravar em duas placas de prata, em grego e latim, o santo Credo Niceno-Constantinopolitano, completo e sem qualquer adição; tendo, além disso, escrito: 'Eu, Leão, preparei estas placas por amor e para a salvaguarda da fé ortodoxa'. (Haec Leo posui amore et cautela fidei orthodoxa)".

Utilizados como forma de aproximação e diálogo, e muitas vezes de forma desonesta, como se o que ele afirma tem a ver com o entendimento moderno do filioque; são algumas afirmações de São Máximo, o Confessor, como a de que o Espírito repousa no Filho ou do envio do Espírito Santo ao mundo através do Filho, conforme em São João cap.14; mas que não se tratam das relações internas da Trindade.


Uma outra diferença, é de que ao se deparar com um mistério, a Ortodoxia não tem por pretensão racionalizá-lo para uma compreensão humana, ela aceita os mistérios como tais, pois "as coisas ocultas pertencem ao Senhor nosso Deus; mas as coisas reveladas pertencem a nós e aos nossos filhos para sempre..." Deuteronômio 29.29


Por conta disso, as diferenças com Roma não são meramente semânticas. Algumas coisas podem ter se originado desse aspecto, da mesma forma que o desentendimento com os anti-calcedonianos, mas o cisma, a separação do Corpo, leva os separados a um estado de esterilidade que, passados muitos anos, vive-se somente em ritos vazios, uma casca que precisa, necessariamente, assumir uma nova forma e inovar, para de alguma forma disfarçar a esterilidade espiritual.

As diferenças são enormes e de ordens variadas. Não se resolve tantas diferenças com arrogância, ou de forma artificial e forçada, como querem os militantes do ecumenismo. Não a troco da Verdade e da verdadeira espiritualidade ortodoxa.



FONTES:


  • The Filioque - T.R Valentine


  • Diakonia, bp.Kallistos Ware - citado em A Voice from the Byzantine


  • Roman Catholicism - pe. Andrew Stephen Damick - Orthodoxy and Heterodoxy - Ancient Faith Podcasts


  • Ortodoxia e Heterodoxia - Catolicismo Romano - Blog Skemmata


  • Blog Skemmata: "Encíclica Patriarcal de 1985: Uma resposta à Encíclica Papal do Papa Leão XIII




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